Neste espaço contaremos a história de nosso querido patriarca
(in memoriam)
Se você participou da história e da vida do nosso esposo/pai Giselto e gostaria de contribuir, será um grande prazer recebê-lo e contar com suas lembranças e carinho para com a construção deste espaço e apresentarmos um pouco sobre nosso patriarca.
Entre em contato conosco pelo e-mail contato@harasdicellius.com.br que teremos prazer em lhe explicar como faremos isso e como você pode participar!
Depoimentos de Amigos
Um Único Encontro e as Várias Lições
Tenho como princípio tentar estabelecer laços fraternais com os atores das diversas atividades das quais participo, na certeza de que, assim, estarei contribuindo, mesmo que seja de uma forma modesta, para a edificação de uma sociedade mais justa e mais cordial.
Entre os vários mundos percorridos, geograficamente e socialmente, sempre busquei amealhar amizades, algumas pontuais, outras duradouras. Em minha caminhada, tenho de destacar minha relação com o universo turfístico. Na verdade, ela começou ainda na minha vida uterina. Quando criança, como quase todos os guris, apostava corridas com os colegas no gramado do Jockey Club Brasileiro e fazia do programa meu chicote. Nós éramos, simultaneamente, o jóquei e o cavalo. E, não poderia ser de outra forma, meu sonho era ser um Rigoni ou um Bequinho, os ases das rédeas naquele tempo. Tamanha a minha frustração ao ver as pernas alongarem-se e me impedirem de seguir a carreira almejada.
Os tempos correm, assim como os puros-sangues, velozmente, e, pouco depois de começar a ensinar na UFRJ, ainda muito jovem, aos 23 anos, comprei meu primeiro cavalo e, de lá para cá, sempre fiz questão de manter pelo menos um em atividade, rotina essa interrompida, apenas, quando ocupado pelas lides universitárias, no Oriente Médio, na África do Norte e na Europa.
Há cerca de cinco anos, resolvi completar o percurso e mandei duas éguas e, posteriormente, um garanhão, que vive no quintal de minha casa, a Bagé, para o Haras Di Cellius, por sugestão do treinador Luís Esteves, grande amigo do dono, Giselto Krutzmann.
Assim que nasceu o primeiro produto, fui visitá-lo. Tamanha foi a minha emoção ao ver a Tayara, recém-nascida, alertando a Holandesa Vip, com os pés, solicitando-lhe o leite materno.
E as viagens sucederam-se quando possível. Eu era sempre ciceroneado pelo Dr. Igor kickhofel, veterinário responsável pelo Haras, com toda a atenção e amabilidade.
Em minha última visita, tive a satisfação de conhecer o senhor Giselto. Aquela foi a única vez que com ele estive, entretanto foi o suficiente para perceber o carinho que nutria pela atividade abraçada e, também, pelo respeito aos animais e, principalmente, àqueles que lá trabalhavam.
Gentilmente, o senhor Giselto convidou-me para almoçar num restaurante da cidade. A refeição alongou-se até o final da tarde, pois passeamos pelos arredores e chegamos a Aceguá, cidade fronteiriça ao Uruguai. À noite, fui recepcionado pelo anfitrião na sede do Haras e, na oportunidade, tive o prazer de jantar com a sua família.
Durante a intensa jornada, o senhor Giselto narrou, com indisfarçável orgulho, parte de sua intensa trajetória e, confesso, eu me emocionei. Percebi que tínhamos algo em comum, ou seja, tentarmos tenazmente criar novos vínculos de amizade e nada melhor para tal que alinhavarmos e narrarmos a outrem o caminho percorrido. Assim, tornamo-nos, de certa forma, transparentes, despidos das imposições da sociedade. Tal procedimento costuma, geralmente, proporcionar uma aproximação natural entre os pares.
Recentemente, com preocupação, acompanhei as notícias sobre o estado de saúde do senhor Giselto durante o período da hospitalização e, infelizmente, com profundo pesar, soube de seu falecimento.
A tristeza, de certa forma, foi amenizada, quando tomei ciência da decisão da família, que, em homenagem à memória do patriarca, anunciou o prosseguimento das atividades do Haras e, desse modo, a preservação de dezenas de empregos.
Faço votos de vida longa ao Haras Di Cellius e boa sorte a todos os envolvidos no prosseguimento do projeto!
Pferdehandwerker
Giselto, pelos cuidados que dedicava nas suas atividades como criador, foi um verdadeiro “artesão de cavalos”, pois preocupava-se com detalhes, até mesmo caprichosos, quase artesanais...
Giselto Krützmann foi, sem dúvida, o precursor da moderna criação do cavalo de corridas feita pelos tradicionais criadores gaúchos. Assevero essa condição pois em 1992, por sugestão de um amigo comum, Giselto me chamou a Porto Alegre para conversarmos sobre como criar cavalos de corrida. Eu trabalhava naquela época para vários haras no Paraná e São Paulo, assim como em Porto Alegre tinha alguns amigos a quem ajudava quando da escolha dos indivíduos e a seguir como planejar a campanha dos seus cavalos.
Logo depois que fomos apresentados, ficamos encerrados no escritório do Posto da Félix, quase por uns dois dias, até que Giselto se convencesse da minha forma de entender a criação, doma, iniciação e campanha de um puro sangue!
Giselto era assim – esgotava aquilo que pretendia conhecer, para só então tomar as decisões necessárias. E a partir de um projeto que rabiscamos é que fui conhecer o Haras Di Cellius, em Venâncio Aires. Ao chegar, foi impossível não ficar entusiasmado, pois ele tinha construído um galpão e tudo mais em volta, com um capricho impressionante! Todas as centenas de vezes que cheguei a uma instalação que fosse do Giselto, era incrível não me sensibilizar com a arrumação, a limpeza e o capricho que existia no ambiente – mais uma das virtudes dele-, o que ajudava muito no desenvolvimento de qualquer projeto que se pretendesse conduzir em conjunto!
Existiam no Di Cellius (nome que ele deu em homenagem a seu pai), naquele ano, três gerações nascidas, das letras A, B e C. As duas primeiras produções praticamente perdidas entre sobreossos, epifisites, maus aprumos e pedigrees fracos! A letra “C”, mais numerosa, mostrava alguns produtos que tinham que ser urgentemente salvos por uma nova orientação e trato adequados.
Acho que eram umas 12 éguas, o plantel do haras, 6 das quais, impraticáveis. Tinha comprado, no ano anterior, o cavalo Despacito, ganhador da milha internacional do GP São Paulo, com um pedigree consistente, mas que havia dado, até então, apenas um produto qualificado em Legislateur e não iria cumprir com as expectativas de Giselto em produzir velocistas. E numa mesa da Churrascaria Santo Antônio, depois de um dia exaustivo e com uma cerveja gelada à frente, veio a pergunta: - “o que achou de tudo que te mostrei ?” Para um empreendedor como Giselto, não outra resposta do que a realidade crua, pois ele saberia como agir, a partir dali: - “ou fazes uma modificação radical no que tens, ou fechas e vais fazer outra coisa, menos criar cavalos de corrida !”.
Foi o que bastou para ele, uma semana depois, comigo já em Curitiba, começar a receber as informações das modificações que se debruçava em fazer! Veterinários e agrônomos especializados que mudariam o trato, assim como o manejo do haras; as mudanças no plantel das éguas; tempos mais tarde, a afortunada aquisição de Coax me Clyde (devem haver não mais que 15 garanhões com produtos saídos do Brasil com figurações bem sucedidas em provas de grupo nos Estados Unidos, e Coax é um deles), bem como o emprego de coberturas de vários outros reprodutores, o fizeram ingressar no grupo de criadores com resultados e com seus produtos sendo muito procurados pelos compradores.
Com o passar do tempo, veio o projeto de assumir o Posto de Fomento do Jockey Club do Rio Grande do Sul, numa iniciativa por demais impressionante! Igualmente a sociedade com Airton Soares, na Agência Longchamp (ingressava num dos pontos fundamentais da criação – a comercialização), até sua ida para Bagé, primeiro nas terras da Coudelaria Pelotense, depois quando adquire o local onde irá consolidar a Agrovin Ltda, até chegar ao píncaro da trajetória de seu projeto, quando incorpora o Haras Simpatia.
Após efetuar uma série de melhorias, Giselto estava pronto para consolidar suas metas fundamentais – criar o cavalo clássico, mas sem deixar de buscar um penqueiro de qualidade para as canchas-retas, onde ele nascera com destaque no turfe brasileiro, revelando a fabulosa “Preta do Mangueirão” – Cat’s Night!
Tendo como experiência o Posto de Fomento, o Haras Di Cellius passou a trabalhar como pensionato para vários clientes importantes que lhe trouxeram outro cavalo expressivo - Mastro Lorenzo. Mas com o novo haras, agora no Simpatia, Giselto aprimorou a qualidade de seus produtos, participando sempre dos condomínios dos principais garanhões importados para o Brasil, permitindo-lhe colocar sua marca, com inúmeros ganhadores de provas importantes, como a campeã Dolly Max, depois First Line, Garota do Verde, Amor Próprio, Ed American, Conde Vic, Valente Master, Quetin Blue, Mama Shangai (invicta), Bobby Secret e muitos outros que não lembrarei, de tantos que foram. E se buscarmos aqueles criados como pensionistas, a lista é imensa.
O Haras Di Cellius, quando chegou ao Uruguai, como era de se esperar, destacou-se sobremaneira, pois ganhou por dois anos seguidos o GP José Pedro Ramirez, com Hielo, assim como liderou uma geração através de Big Chendo, bem como revelou Incompatible e Hastquina, entre vários outros!
Quanto aos velocistas, Giselto conseguiu produzir verdadeiras “máquinas” nas retas, como já antes conseguira com Little Big Lark, para em tempos mais recentes revelar craques inesquecíveis em Aromatic Lady (Coax), Concorde News e Habile Bobby!
Agora quando me despeço de ti, meu caro, só posso dizer, mesmo com a dor da perda, mas com a alegria das muitas lembranças dos sucessos alcançados: “você soube, como ninguém Giselto, CRIAR CAVALOS DE CORRIDA!!!”